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Ou muda ou quebra

Alvaro Paes Leme | 17/04/2019

Um novo governo começa esse ano e com isso velhos desafios voltam à pauta principal. Com as delações premiadas de Ricardo Saud e Joesley Batista, o governo Temer acabou e, junto a si, enterrou assuntos fundamentais para a retomada do crescimento nacional. Pautas como a Reforma da Previdência foram prontamente engavetadas. Contudo, o cenário agora é diferente, temos um novo Congresso e, mais importante ainda, uma nova Presidência, com, de início, amplos poderes populares.

Antes mesmo da corrida eleitoral começar, o presidente Jair Bolsonaro deixava claro a sua ligação às pautas reformistas, confirmando como Ministro da Economia o liberal Paulo Guedes. A consolidação fiscal seria, claramente, a meta do governo. As presidências que o antecederam, entregaram as contas públicas em um péssimo cenário, com resultado primário de -2,2% do PIB e dívida pública no patamar de 80%, deixando claro o quadro devastador.

Para entendermos o cenário da economia nacional, é necessário termos em mente uma série de fatores. Ao assumir a Presidência da República, Michel Temer se deparava com uma queda do PIB de 3,5%, o desemprego em 11,2%, um déficit de 2,6% e a inflação na casa dos 10%. Nessa perspectiva, os tradicionais instrumentos de política anticíclica estavam fadados a fracassar. Em um caso de política fiscal expansionista, a elevação da dívida pública poderia levar a uma crise sem precedentes no cenário nacional. Já a política monetária, era impossibilitada pela alta da inflação, cujo histórico a torna ainda mais perigosa no cenário político. Esse quadro se mostrava extremamente desafiador e seria necessário ter em mente que as velhas soluções de política anticíclica não iriam dar certo. Diante disso, Ilan Goldfajn, à época, presidente do BACEN, decidiu manter a taxa Selic elevada, permitindo, com a credibilidade que o cargo demanda, a queda da inflação. Posteriormente, com o objetivo da política monetária alcançado a inflação em níveis seguros, foi possível movimentos de queda da taxa Selic, levando- a a um quadro de baixa inflação e taxa de juros básica. Dessa forma o problema inflacionário estava resolvido.

Contudo, o quadro fiscal ainda era um problema a ser resolvido. O primeiro desafio, a PEC 241 (ou PEC 55, no Senado), que estabelecia o teto de gastos, foi importante para introduzir quase uma obrigatoriedade do ajuste fiscal. Nesse difícil movimento político, o presidente gastou muito seu capital político, visto que os gastos seriam congelados em valores reais no período de 20 anos. Tal medida era um estímulo à Reforma da Previdência. Contudo, diante da impopularidade do governo e da proposta, além de se tratar de um período eleitoral, a proposta foi esquecida.

Diante disso, o novo governo encarou um quadro de juros e crescimento baixos, inflação controlada e quadro fiscal de difícil solução, devido à parte política. Caberá ao executivo levar a frente uma série de reformas fiscais, tendo como a de maior destaque a Reforma da Previdência, devido a difícil tramitação no meio político. A proposta atual é arrojada e apresenta soluções de curto, médio e longo prazo. Contudo, as soluções se entrelaçam. Como dito pelo próprio Paulo Guedes, a economia de 1,1 trilhão seria um “foguete fiscal” para que se consiga fazer uma transição para um futuro regime de capitalização, não fadando a próxima geração a um regime falido. Para termos ideia do quadro que o presidente Bolsonaro recebeu. A dívida que chegou a alcançar a casa de 60% do PIB durante o primeiro período do governo do ex-presidente Lula, marcado pela manutenção da política fiscal heterodoxa, herdada do governo anterior, hoje passa dos 80%, devido à péssima política fiscal do governo Dilma, principalmente.



Sem a Nova Previdência, o futuro do país será o fracasso. Todo o governo deve atuar para essa pauta, para que não haja qualquer possibilidade de não aprovação de uma reforma que dê o folego fiscal necessário. No entanto, não é o que acontece atualmente. Membros do governo e forças políticas aliadas, autodenominados Ala Anti-Establishment, parecem forçar para que a principal pauta do início do governo fracasse. Embates com importantes nomes de articulação política como foi o caso do filho do Presidente, Carlos Bolsonaro e com o Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, colocam em risco a aprovação. Cabe ao presidente gerir os atritos entre os grupos, a crise deveria sair do gabinete da presidência menor do que entrou. Contudo, a atuação de Bolsonaro vai no extremo oposto, tendo o presidente entrado em combate contra Maia. Foi necessário que uma série de Ministros intervissem, retirando da órbita do presidente, momentaneamente, nomes da ala mais ideológica, para ele entender que o embate franco com Rodrigo Maia seria um mal para a Reforma, e, logo para todo o futuro do governo.

Quem tomava as rédeas da articulação política, por enquanto, é Paulo Guedes que já se reuniu com nomes importantes como o presidente da Câmara dos Deputados e do Senado Federal para iniciar esse processo. Ao seu lado, também estava o Secretário Especial da Previdência e Trabalho, Rogerio Marinho, nome visto como vital, uma vez que se encaixa mais em um quadro de composição de maioria. Vale deixar claro que Onyx Lorenzoni se sente muito ameaçado, como foi noticiado pelo jornalista Lauro Jardim, diante das possibilidades de ataques parecidos com o que culminou na queda de Bebiano. Além disso, da Virgínia, EUA, o guru ideológico do governo, Olavo de Carvalho, ataca uma série de aliado, tendo como caso mais recente o do vice-presidente General Mourão e o Ministro da Secretaria do Governo, General Santos Cruz. A divisão entre a Ala Anti-Establishmet e a Ala Militar pode fazer com que o governo tenha que sangrar ainda mais a reforma para a sua aprovação. Contudo, Guedes e Maia já recuaram, temendo possíveis atritos com Onyx, uma vez que a articulação é seu dever como Ministro Chefe da Casa Civil.

Vale ressaltar a percepção dos deputados acerca da proposta apresentada. Em pesquisa publicada na terça feira, dia 09 de abril, a XP mostrou a visão dos deputados acerca da Reforma da Previdência. Dos deputados da ala governista, raio de atuação que o governo precisa focar, apenas 10% concorda com a proposta atual plenamente. 56% acha que são necessárias algumas alterações, cabendo ao governo olhar o que deve ser alterado, se preocupando em não descaracterizar a reforma, contudo sem esquecer os votos necessários. Diante dessas alterações, deve-se olhar para os deputados que acreditam ser necessárias muitas alterações, cerca de 25% da ala governista, para conseguir ali os votos finais da Reforma.

Diante da elucidação do quadro político, cabe também passar a vista no que ocorreria nos cenários possíveis. Em um quadro sem as reformas fiscais, segundo o Ministério da Fazenda, como foi defendido na publicação do “Panorama Fiscal de 2018”, de dezembro de 2018, vistas como cruciais pelo novo governo, a economia entraria em um quadro de solução inviável. O crescimento do PIB estaria perto de 0, porém na maioria dos anos sendo positivo. A inflação avançaria de um cenário perto dos 4% para um que passaria dos 7%, apesar de uma provável forte política contracionista realizada pelo Bacen, para manter a inflação minimamente controlada. Ademais, vale ressaltar a inevitável valorização do dólar frente ao real, levando o câmbio perto de R$5,00. Não contar com a Reforma da Previdência seria um cenário desastroso para o Brasil como um todo.

O futuro do país com a Nova Previdência, contudo, já seria melhor. Diante do melhor cenário fiscal do governo, a tendência seria uma retomada da confiança por parte dos investidores. Nesse cenário a retomada do crescimento seria quase iminente. O crescimento do PIB se estabeleceria na casa dos 2%. A inflação estacionaria em 3,7%, com uma política monetária menos contracionista, tendo a Selic em 8% ao invés de 13%. Por fim, o câmbio se estabilizaria na casa dos R$4,00.

O mercado, por enquanto, ainda acredita na aprovação da Reforma, como foi visto no último relatório Focus, que manteve um crescimento razoável, mantendo as previsões dos indicadores macroeconômicos muito mais próximas do segundo cenário. Esse otimismo dependerá muito de uma mudança dos nomes que cercam o chefe do executivo. Enquanto os principais aliados do presidente forem seus filhos e o assessor especial Filipe Martins, que compõem a Ala Anti-Establishment, o fracasso da articulação é inevitável. Não são nomes de composição e articulação política, mas sim, de “infantaria política”, ou seja, de embate político direto, via palanques, mídias sociais e tribuna.

Não passar uma série de reformas fiscais é um privilégio que esse governo não pode ter. Por mais impopulares que sejam, elas são necessárias para a retomada do crescimento nacional. Deve ter em mente que “existe um discurso de campanha e outro discurso de governo” e a campanha já acabou. Sem a Reforma da Previdência é impossível imaginarmos uma economia minimante saudável. Tudo passará por uma série de reformas, que não terminam na previdência. O Brasil tem duas opções claras, que passam por uma decisão do governo atual: ou ele muda a sua postura, saindo do enfrentamento, indo em direção a um comportamento de composição de maioria, ou, o governo quebra.

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