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PIX: O GRANDE PASSO PARA A REVOLUÇÃO DO SETOR BANCÁRIO NACIONAL

Atualizado: 2 de ago. de 2022

Ana Maria Varela

Ronaldo de Souza Raposo Sobrinho


I. O SUCESSO DO PIX: TERROR DAS AGÊNCIAS BANCÁRIAS?

Uma das maiores inovações promovidas pelo Banco Central nas últimas décadas, o Pix completa 6 meses de vigência e já conta com inovações para revolucionar ainda mais o sistema de transações no país. Realizar transferências imediatas era algo impensável há menos de um ano. Não porque não existia nenhuma tecnologia no mundo capaz disso -- pelo contrário, veremos à frente os modelos empregados por outros países e que influenciaram o Pix --, mas porque tal mudança traria implicações para a manutenção do status quo de muitas instituições bancárias no Brasil.

As transações bancárias ocorriam exclusivamente por meio de TED ou DOC, duas operações circunscritas, sobretudo, à jurisdição das instituições financeiras brasileiras. A transferência precisava ser urgente? Uma pena! Aguarde algumas horas -- ou dias -- para completar a operação. Este nível de vulnerabilidade com o qual a população brasileira lidava, sujeita sempre à mercê dos bancos, foi um fator decisivo para que o Banco Central criasse, em novembro de 2020, o Pix. Os impactos dessa inovação foram logo percebidos pelo mercado: este sistema já responde por metade das transferências bancárias realizadas no país, conforme dados divulgados pelo Banco Central em maio de 2021.

O TED e o DOC perdem sentido diante ao PIX pois ele está disponível 24 horas por dia, podendo ser utilizado também em finais de semana e feriados, além de ser gratuito para as pessoas físicas. Já as pessoas jurídicas (empresas/lojistas), poderão ser cobradas uma taxa fixa por transação ao receber ou fazer pagamentos e nas transferências realizadas entre empresas.

Ademais, a adesão por pessoas físicas é muito simples, só é preciso cadastrar uma chave, que é uma forma de identificar o usuário dentro do ecossistema Pix, assim, não há a necessidade de digitar todos os dados da conta. A chave pode ser: o CPF/CNPJ, o celular, o e-mail, ou a chave aleatória, que é um código alfanumérico gerado. Após o cadastro, basta entrar no aplicativo da instituição financeira e ir ao menu dedicado ao sistema, selecionar a opção transferir, inserir a chave do destinatário e pronto, a quantia cai na mesma hora. Essa é uma vantagem importante pois proporcionou aos brasileiros praticidade e instantaneidade.

O estudo realizado pelo Data Nubank revelou que o Pix alcança todas as faixas etárias e de renda no Brasil, tendo ultrapassado em volume e em quantidade o fluxo mensal de TEDs e DOCs. Estes dados reiteram a urgência que os brasileiros tinham por realizar transferências fora do horário comercial e, sobretudo, de forma simplificada, dados os juros transacionais contidos nas operações de transação dos bancos. 49% das transações por Pix ocorrem após as 17h e em finais de semana, evidência de que este novo sistema atende a múltiplos cenários ao redor do Brasil.



Somente em abril, o sistema movimentou mais de 300 bilhões de reais. Além da variável descrita anteriormente sobre a demanda social por um sistema instantâneo, o Pix chegou em um momento bastante singular: a necessidade por distanciamento gerada pela pandemia de Covid-19 fez crescer a busca por soluções alternativas aos caixas eletrônicos e demais ações que pudessem expor o público ao risco do vírus. Por atender tanto pessoas físicas quanto jurídicas, o sistema foi -- e é -- um sucesso crescente.

Outro fato de destaque é a capacidade democrática do sistema de atender às populações menos abastadas do Brasil. A mobilidade é um problema em diversas regiões, de modo que o deslocamento para agências bancárias é um impeditivo para milhões de brasileiros, sobretudo em pandemia. Segundo dados do Banco Central, mesmo atingindo todas as classes sociais, o efeito do Pix foi mais contundente na classe média baixa, sobretudo em localidades periféricas e pouco densas urbanisticamente. O uso intuitivo da plataforma e as funcionalidades que recriam o ambiente físico permitem que quaisquer pessoas consigam realizar transações, desde que tenham acesso à internet.

Dadas a facilidade e acessibilidade desse sistema de transação, o que chama a atenção dos bancos é a integração com fintechs, instituições recém-lançadas e que atraem o encantamento do brasileiro. Os bancos são conhecidos por processos demasiadamente burocráticos. Em vista do seu monopólio nas operações financeiras, mudanças estruturais na forma com a qual lidam com o seu público-alvo nunca foram uma prioridade latente. Este, inclusive, é um fator que permite analisar o sucesso estrondoso das contas digitais: seja Nubank, C6 ou Inter, a experiência proporcionada ao usuário e a facilidade para lidar com assuntos até então complexos faz migrar um grupo estratégico para as instituições bancárias: a classe média.

Assim, o Pix emerge em um momento de instabilidade para os bancos, permitindo ainda diálogo direto com tais fintechs. É possível, por meio do sistema Pix, realizar pagamentos em tempo real em estabelecimentos comerciais, pagar contas como luz e água e até mesmo recolher impostos. As Fintechs, como plataformas de pagamento como Mercado Pago e Picpay, aceitam realizar operações por meio do Pix. Assim, analisa-se o contexto: plataformas digitais com menor burocracia para abertura de contas permitem realizar transações bancárias de forma simples, otimizada e sem juros. A inclusão financeira chegou ao Brasil, e os bancos não conseguiram perceber a tempo.


II. É INTUITIVO, É FÁCIL, É ÚNICO. MAS POR QUE É TEMIDO?

Embora seja muito simples o processo de cadastro, as pessoas mais conservadoras levarão mais tempo para se adaptar ao sistema, em função da resistência à tecnologia como um todo. Logo, apesar da crescente exponencial, haverá um momento de curva de amadurecimento. Ainda assim, à medida em que empresas de grande porte aderem ao Pix, o sistema aumenta sua superfície de contato com a população, alcançando desde o pequeno produtor até as agroempresas, visando a uma maior fluidez de recursos e rapidez de recebimento e pagamento, puxando toda a cadeia produtiva.

Para uma melhor compreensão dessa curva de amadurecimento, é importante entender como funcionam os sistemas equivalentes ao Pix ao redor do mundo e quais mudanças foram provocadas no mercado financeiro com a sua implementação. Hoje, a Índia é líder mundial no número de pagamentos instantâneos: um a cada dois indianos está cadastrado no Unified Payments Interface (UPI), sistema de transferência em tempo real que permite aos usuários movimentar dinheiro entre contas bancárias em uma plataforma móvel. O sistema foi a melhor inovação financeira pós-independência na Índia e iniciou o processo de substituição da economia de dinheiro em espécie por completo, contribuindo para tornar o país uma das economias digitais de crescimento mais rápido do mundo.

Em 2016, a UPI foi uma das primeiras a permitir que os clientes selecionassem entre números de telefone, números de conta e aliases, refletindo flexibilidade na forma como eles se identificam para fins de recebimento de pagamentos. A solução do Brasil foi lançada com muitos dos recursos de endereçamento vistos na UPI, como mencionado anteriormente, o sistema permite que os usuários selecionem um número de telefone, endereço de e-mail ou outro alfanumérico como seu alias. O gráfico abaixo mostra o desenvolvimento do sistema na Ìndia, cuja evolução inicial é análoga ao Pix.

Outro país cujo sistema merece destaque é a China, pioneiro em pagamentos instantâneos, por meio de carteiras digitais e QR Codes. Os chineses utilizam basicamente dois aplicativos para fazer e pagar as compras, o Alipay e o WeChat Pay. Juntos, estes 'superaplicativos' agregam uma série de outros serviços e funcionalidades, permitindo que seus usuários realizem o máximo de operações bancárias possível. O Alipay é do mesmo grupo do Aliexpress. Já o WeChat é um aplicativo que foi criado para ser uma rede social parecida com o WhatsApp, mas que hoje tem muitas funcionalidades e uma delas é possibilitar a realização de pagamentos.

Por ter um histórico de falsificação de dinheiro e enfrentar problemas de fraudes em papel-moeda, o país investiu em fintechs e na criação de novos meios de pagamento digitais. Por esse motivo, e também como estratégia de prevenção a fraudes, é raro encontrar estabelecimentos que ainda aceitam dinheiro em espécie. Estima-se que 50 milhões de microempreendedores com negócios físicos utilizam recursos de pagamento por QR Code. Assim, a maioria dos lojistas não arcam mais com os custos das transações e, consequentemente, não precisam repassar para o consumidor final, tornando o comércio mais dinâmico.

Atualmente, o estímulo ao uso de carteiras móveis, aliado às questões de segurança e conveniência faz com que 80% da população chinesa realize transações financeiras e tenha acesso ao crédito por meio de contas digitais. A China é o país mais avançado nesse novo sistema. Contudo, apenas duas empresas operam neste mercado, o duopólio formado entre a Alibaba e a Tencent, responsáveis pelos respectivos aplicativos. Além disso, o dinheiro não transita entre elas, implicando segmentação de recursos na economia chinesa.

Embasado no valor do mercado de pagamentos por aparelhos móveis no país, a AliPay tem 54% de participação e a WeChatPay responde por 39%, de acordo com a consultoria Analysys. Neste ano, esse método de pagamento representa mais da metade da circulação de dinheiro no varejo do país. O próximo passo das big techs chinesas deve ser a implementação do recurso de reconhecimento facial nas plataformas. Enquanto isso, o governo tenta controlar o monopólio das corporações com o uso do Renminbi digital, criptomoeda prevista para se tornar o padrão de trocas monetárias na China até o final de 2022.

À luz desses dois casos, percebe-se que a chegada do PIX representa um grande passo à caminho da verdadeira revolução digital no setor bancário brasileiro. O Brasil se tornou o oitavo país com mais transações instantâneas após o lançamento. Pelo que foi observado em outros países que já adotaram os pagamentos instantâneos, essa curva de amadurecimento do sistema pode ter um começo arredio, mas a tendência é que dentro de um curto horizonte de tempo o crescimento torne-se exponencial. Por isso, acredita-se que a taxa de crescimento anual composta (CAGR) do Pix será de 25,3% em um intervalo de cinco anos.

Apesar de tais previsões ótimas, cabe reiterar que as camadas mais conservadoras da população brasileira ainda discutem os impactos à segurança pessoal por parte do Pix. Segundo estes grupos, as chaves podem ser utilizadas para roubar dados dos usuários, acarretando invasões aos dispositivos móveis possíveis golpes por meio do QR Code. Contudo, cabe ressaltar que esta exposição a fraudes não é produto do Pix, mas sim da adoção de um sistema mais novo e tecnológico. Angelo Duarte, diretor do Banco Central, destacou que estas ameaças são as novas estratégias criadas pelos golpistas do século XXI. Por isso, é necessária demasiada atenção no compartilhamento de dados e recebimento de informações. Apesar das múltiplas melhorias que foram e estão sendo empregadas, questões correlatas a dinheiro sempre envolveram cuidado, e não é porque agora elas ocorram de forma virtual que ele deve deixar de existir.


III. UMA INOVAÇÃO COM MUITAS INOVAÇÕES EM VISTA

O relatório sobre economias digitais, publicado em 2019 pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) revelou um ranking com as 10 economias que mais movimentaram seus setores de Tecnologia da Informação e Comunicação entre 2010 e 2018. A China ocupa o segundo lugar, ao passo que a Índia pode ser encontrada na sexta posição. Somatizando um conjunto de ações e medidas empreendidas pelos respectivos governos nacionais, não se pode deixar de fora o impacto dos sistemas de transferência desses países na performance observada no relatório.


Assim, percebe-se que o advento deste sistema no Brasil responde não somente a uma demanda popular como também a uma agenda de expansão econômica, visando a tornar o sistema financeiro nacional mais tecnológico e, por conseguinte, democrático. Por mais que determinadas instituições "percam" sua posição de destaque no que tange às operações de transação, a contrapartida disso é um fluxo mais intenso de participação na economia por milhares de brasileiros, adensando as trocas e fazendo o dinheiro circular mais facilmente ao redor do país.



O Banco Central informou que novas funções serão disponibilizadas no sistema Pix. Estas novidades fazem parte da agenda do Bacen para este ano, com o objetivo de entregar um serviço cada vez mais amplo e eficiente para os usuários. Assim, a inovação, que conta com pouco mais de seis meses, já traz outras inovações em vista: uma delas já foi disponibilizada no final de abril, a qual permite movimentar o dinheiro recebido pelo auxílio emergencial por meio do sistema de pagamentos, visando a atingir aqueles que não conseguiram receber o auxílio nesta quarentena por falta de uma conta na Caixa Econômica Federal (CEF). Com o Pix, esse pagamento não precisaria ser feito a contas da CEF, mas sim a um CPF, necessitando somente de estar vinculado a uma conta de alguma instituição bancária.

Outro lançamento recente foi o PIX Cobrança, modalidade de pagamentos que começou a operar no dia 14 de maio. Os bancos e as demais instituições financeiras que aderiram ao Pix agora podem oferecer um serviço semelhante ao boleto bancário, mas que permite o pagamento imediato a empresas e prestadores de serviços por meio do QR Code.Há também, a possibilidade de inserir multas, descontos e juros. Por enquanto, o serviço não permite agendar vencimentos futuros, mas essa funcionalidade entrará em funcionamento a partir de 1º de julho, segundo dados divulgados pelo Banco Central.

O segundo semestre de 2021 já conta com lançamentos de novas funcionalidades e ferramentas. Dentre eles está o "Pix Agendado", no qual será possível deixar um valor agendado para transferência via Pix na data futura desejada. Outras inovações bastante aguardadas são o "Pix Saque" e o "Pix Troco'', serviços que possibilitam o resgate de dinheiro em estabelecimentos comerciais, facilitando o acesso a dinheiro em espécie. Uma das normas dispostas pelo BC é a possibilidade de que os usuários realizem até quatro saques gratuitos por mês com limite de R$500 por dia. A partir da quinta transação, as instituições financeiras ou de pagamentos poderão cobrar uma tarifa pela transação.

Ainda de acordo com o Banco Central, a experiência do usuário será idêntica a de um pagamento via Pix: basta a leitura de um QR Code ou código para identificar o pagamento e realizar a transferência. A diferença é que, em vez de receber um produto ou serviço, receberá o correspondente valor em dinheiro em espécie. No caso do Pix Troco, o saque é conjugado como uma compra. O usuário poderá realizar a compra de um produto no mercado e, ao efetuar o pagamento, será realizada uma transação com um valor maior, recebendo a diferença em dinheiro.

Os agentes de saque poderão ser estabelecimentos comerciais ou empresas dos mais diversos tipos. O BC estuda, ainda, instituições especializadas na oferta de serviço de saque, como entidades que provêm os serviços dos caixas 24h. A proposta do Banco Central também determina que os comércios poderão definir suas próprias regras, como estabelecer os dias da semana em que o serviço ficará disponível, se vão ofertar um ou ambos os serviços e como será efetuado o saque -- como quais cédulas serão permitidas. O BC acredita que os serviços darão mais conveniência ao usuário, pois ampliarão o serviço de saque e incentivarão a competição, por meio de mais pontos de oferta.

Os impactos do Pix já são expressivos na economia, cuja tendência é apenas aumentar ao longo do ano de acordo com cada nova funcionalidade a ser lançada. Os benefícios são muitos, seja para usuários, lojistas ou até mesmo instituições bancárias: por mais que se perca nos juros sobre as transações, ganha-se no aumento da circulação de capital. Quanto ao apelo junto ao usuário, esta missão cabe única e exclusivamente aos bancos. Transferência, saque, troco, agendamento, cobrança: se tais operações geravam tanto estresse antigamente, elas agora podem ser feitas instantaneamente. Esse é o futuro!



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