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Por que Roberto Campos Neto foi considerado o banqueiro central do ano?

Por Ragnar Chaves


O mundo inteiro sofreu os efeitos econômicos e sanitários da pandemia causada pela COVID-19, que exigiu respostas das autoridades em diferentes âmbitos. Diversas políticas fiscais e monetárias foram postas em prática a fim de atenuar as consequências sofridas por famílias e empresas, evitando que a crise fosse ainda maior. Nesse sentido, o Banco Central teve uma atuação imprescindível, o que levou Roberto Campos Neto, presidente da autarquia, a ser eleito banqueiro central do ano pela revista britânica The Banker. O ano de 2020 foi marcado pela boa atuação do Banco Central (BC) em outras áreas, como no sistema financeiro e no sistema de pagamentos, em que houve avanços com o open banking e a implementação do PIX. Assim, este artigo busca expor brevemente algumas das ações do BC que levaram ao reconhecimento da sua brilhante atuação no ano de 2020.

Um ponto importante a ser destacado é a velocidade com que foram implementadas as medidas de combate aos efeitos econômicos e financeiros causados pelo Coronavírus. Essas foram anunciadas no dia 23 de março e totalizavam, inicialmente, em potencial de impacto, 1,21 trilhão de reais em liberação de liquidez e 1,15 trilhão de reais em liberação de capital. Como destacado pelo próprio BC, as medidas visavam a:


1 – Manutenção do sistema bancário líquido e estável;

2 – Garantia de um sistema capitalizado, a fim de sustentar o canal de crédito;

3 – Oferecimento de melhores condições para bancos rolarem as dívidas de setores mais afetados pelo Coronavírus, evitando eventuais contágios;

4 – Garantia da normalidade do mercado de câmbio, sem disfuncionalidades por ausência de liquidez;

5 – Manutenção de condições monetárias estimulativas, a fim de impulsionar o crescimento econômico por meio do canal de crédito.

Para garantir os objetivos elencados acima, o BC utilizou diversos instrumentos de política monetária. Quanto à liberação de liquidez (medida com maior impacto), a autoridade monetária reduziu a alíquota de 31% para 25% e posteriormente para 17% nos depósitos a prazo. O impacto total da liberação dos compulsórios foi de 251,7 bilhões de reais no ano de 2020. O que isso significa?


Bancos centrais retêm parte do dinheiro dos bancos a fim de garantir a estabilidade do sistema financeiro e impedir que emprestem mais do que têm. Por exemplo, uma alíquota de 25% dos depósitos à vista significa que os bancos devem reter no BC pelo menos 25% do montante que seus clientes têm em suas contas corrente ou de pagamento. Reduções na alíquota permitem que os bancos tenham mais recursos disponíveis (maior liquidez) para realizar esses empréstimos.

Além disso, foram concedidos empréstimos lastreados em Letras Financeiras Garantidas, que são títulos de renda fixa emitidos por instituições financeiras, com o objetivo de oferecer mais liquidez e estabilidade para o sistema financeiro. Ao todo, foram realizadas 9 tranches de empréstimos que totalizaram um volume de 105,1 bilhões de reais a 51 instituições, frente ao impacto estimado de 670 bilhões de reais.

O BC também interveio no mercado de debêntures através de empréstimos com garantias nesses títulos. A forte necessidade de caixa das empresas para financiar os custos da pandemia pressionou a oferta de debêntures, enquanto a menor procura por ativos de risco afetou a demanda, levando a maiores taxas de captação pelas empresas. Nesse sentido, os empréstimos concedidos estimularam os bancos a adquirirem esses papéis. Assim, essa medida foi responsável pela redução em 30% do spread observado no mercado secundário de debêntures.

Não menos importante e mais facilmente observado por quem não tem o hábito de acompanhar o dia a dia da autoridade monetária, o BC reduziu a taxa SELIC para níveis históricos, com uma meta de 2% ao ano em 2020. A SELIC é o principal instrumento de manutenção do mandato da instituição, que é o regime de metas para inflação. No contexto da pandemia, com queda na demanda devido às restrições sanitárias, a economia desaquecida tende a levar o nível de preços, cujo parâmetro é o IPCA, para baixo. Assim, o Banco Central responde a esse movimento com queda nas taxas de juros, a fim de levar a inflação para a meta. Esse movimento também tem efeito de estimular a demanda.

Outro ponto crucial para a premiação de Campos Neto é a atuação do BC quanto ao Sistema Brasileiro de Pagamentos (SBP). Desde 2013, quando a autarquia passou a ser responsável pelo SBP, implementou diversas medidas que tornaram o arranjo de pagamentos (termo definido pelo próprio BC) mais bem organizado e mais competitivo entre as instituições que o compõem, como as adquirentes, as famosas empresas de maquininhas de cartão. Se antes de 2013 o setor de adquirência era altamente concentrado nas mãos da Cielo e da Rede, depois de 2013 esse cenário mudou, com novas adquirentes como Stone e PagSeguro, não pertencentes a bancos, disputando espaço.

A partir de 2016 o BC instituiu a Agenda BC#, a fim de desenvolver questões estruturais do sistema financeiro, por meio de ações que impliquem queda no custo de crédito, modernização da lei e eficiência no sistema, competitividade e transparência. Dentre os principais pilares que norteiam essa agenda, para estimular a competitividade, o BC define ações como inovações em pagamentos instantâneos e o open banking.

Em linhas com as mudanças ocorridas nos últimos anos, em 2020 o Banco Central deu um grande salto no que tange a pagamentos instantâneos, através do PIX. A nova ferramenta foi lançada no dia 16 de novembro de 2020 e possibilita pagamentos e transferências em segundos a qualquer instante e gratuitamente. O novo meio de pagamento possibilita a substituição do TED, DOC e de boletos, que só poderiam ser realizados em horário bancário, além de terem custo. Desde o seu lançamento, no dia 16/11, já foram transacionados mais de 214 bilhões de reais. Para que se tenha uma noção de impacto, nos meses de novembro e dezembro, o valor transacionado em cartões de débito e crédito foi de 295 bilhões de reais, segundo a ABECS (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços).

Quanto ao open banking, que prevê, dentre outras coisas, o compartilhamento de dados de clientes entre instituições financeiras, os planos do BC foram afetados pela pandemia e, embora a previsão de início da implementação fosse também para novembro, a primeira fase foi adiada para fevereiro de 2021. Ainda assim, o balanço para o Banco Central no ano é positivo, como exposto até agora, neste artigo.

Nesse sentido, cabe parabenizar não só o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, mas também todo o corpo de servidores, que tem demonstrado elevada competência. Além dos esforços em promover avanços nos sistemas financeiro e de pagamentos, como foram aqui destacados, com seu brilhante desempenho, também foram capazes de minimizar os efeitos devastadores causados pela pandemia, mantendo acesas as esperanças de que o Brasil conseguirá avançar em reformas e consequentemente melhorarem o ambiente de negócios para promover crescimento.



Referências:


ABECS, 2021. Disponível em <www.abecs.org.br>


Banco Central do Brasil, 2021. Disponível em <https://www.bcb.gov.br/>


Banco Central poderá conceder empréstimos com lastro em letras financeiras garantidas. Anbima. Disponível em <https://www.anbima.com.br/pt_br/noticias/banco-central-podera-conceder-emprestimos-com-lastro-em-letras-financeiras-garantidas.htm>



The Banker Editorial. Central Banker of the Year 2021. The Banker. Disponível em <https://www.thebanker.com/Awards/Central-Bank-Governor-of-the-Year/Central-Banker-of-the-Year-2021>


TAIAR, Estevão. Liberação de depósitos compulsórios soma R$ 251,7 bilhões em 2020. Valor Econômico. Disponível em <https://valor.globo.com/google/amp/brasil/noticia/2021/01/17/liberacao-de-depositos-compulsorios-soma-r-2517-bilhoes-em-2020.ghtml?__twitter_impression=true>


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